Rincón
É tudo o que ouço há horas. E para além do movimento das ondas… só o sobrevoar de um casal de pelicanos.
Atravesso a meia dúzia de casas que se segue. Só sei que existo porque a água me acorda os tornozelos. Não há vivalma. Apenas vestígios de redes que baloiçam como que abandonadas.
As casas aqui… esta breve dezena… são de tons pálidos, que o mar ainda os fez mais pálidos.
As mais antigas têm a varanda fechada em grades de ferro branco… em tempos, agora castanho ferrugem.
Muito mais tarde… o que talvez fosse um fim de tarde… olho o mar e vejo-me num espelho, sem medo da solidão ou de mim própria.
As uvas suam e o tempo passa com a velocidade certa.
Então fotografo-me em espelhos… como que a dizer: “estou aqui”.
Um dia perguntaram-me, frente à ampla visão de um rio serpenteado em Angola, o Kwamza, se eu ainda era capaz de me surpreender com as paisagens … com outros mundos. Eu própria mo perguntei no meu primeiro dia em Rangoon, aterrorizada pela solidão… Tenho a certeza que sim. A mais pequena flor, as pessoas, sim as pessoas, na sua atitude mais simples e natural, o vento e a humidade e o quente e o chão que me suja os pés. Sinto-os vividos, aos meus pés… absorveram mais pedaços de terra do que eu própria.
O que dizer de Rincón se nem em Rincón estou. Num bocado de costa entre aqui e ali, numa dessas ruas tortuosas que parecem ir dar a lado nenhum. É aí que estou. Nesse pedaço de baía, habitado por fantasmas de dez casas. Onde o mar me se reflecte ou se me reflecte, num horizonte sempre estável. Onde a densa vegetação se vê numa luta constante com o tal mar… onde a areia já há muito perdeu o seu lugar.
O ar densifica-se de insectos e o mar e o céu transformam-se num só. Aterram insectos no meu vestido branco mas já nem os mato… ou seria uma mortandade.
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