Depois dos primeiros dias agradáveis em CAPE TOWN com a sua paisagem deslumbrante, e a “peregrinação”, sentida com verdadeira emoção, ao CABO DA BOA ESPERANÇA, aqui com o nome de CAPE OF GOOD HOPE, envio este mail-reportagem para a família e para alguns amigos que o possam ler...
Estamos já no centro do Atlântico Sul que é tal como o Pacífico o outro oceano mítico, totalmente aberto para a ANTÁRTIDA, que o torna como um prolongamento da mesma exercendo a sua influência nas correntes frias ascendentes das quais a corrente de Benguela é um exemplo, e pelos ventos fortes existentes, bem como a temperatura da água do mar em pleno verão do hemisfério sul, que em Cape Town era de 12oC mantendo-se nos 14oC até à costa da NAMÍBIA – há até pinguins no Cabo da Boa Esperança - e agora que estamos a 1000 kilómetros de SANTA HELENA já é de 21,8oC.
Os dias a bordo não são de ócio. Somos 5 pessoas e todos temos 2-3 turnos de “quarto”, cada 24 horas, em que estamos sós assumindo o total controle da Navegação num navio muito automatizado, mas delicado e muito caro, com controle de rotas em função de ângulo e velocidade dos ventos, que neste momento já são os chamados alísios (trade winds em inglês), e com atenção rigorosa a eventuais rotas de colisão com outros navios; depois destas 2 horas dorme-se “como uma pedra”. Quanto ao resto temos uma cozinheira óptima, que não quer ninguém a cozinhar na cozinha dela …
Quanto a mim, tenho muitas saudades da minha mulher, dos meus filhos, do meu neto e da minha nora, mas procuro sublimar este sentimento, para não perder o momento enorme que estou vivendo. Sonhava fazer uma travessia num oceano mítico, e está a acontecer… É uma sensação fantástica, de uma alegria interior com vontade de “explodir”, que devo aos amigos RAFAEL DUDZIAK e GUSTAV STABERNACK, e á minha mulher e meus filhos, que me apoiaram e suportaram a “infra-estrutura”. Incluo no meu pensamento de gratidão o nome de um grande historiador da navegação portuguesa e grande marinheiro, que me aconselhou e forneceu a informação histórica necessária sobre o trajecto que ia ser percorrido – Comandante MALHÃO PEREIRA.
É também o orgulho de fazer uma travessia de um mar inóspito e solitário, que poucos fazem, mas eu tinha que o fazer… e estou a fazê-lo…
E é também uma espécie de herança para a nossa “estrelinha”. O céu tem estado sempre encoberto de dia e de noite, só houve 2 noites em que havia estrelas e nuvens, tentei encontrar a nossa estrelinha mas ela não estava ali…, estava com os pais… ou talvez com a avó…
Tenho tempo para ler, mas só trouxe o livro que o Alexandre me ofereceu, que devorei em 4-5 dias, agora estou a ler um livro em inglês que o Gustav me emprestou – A GUERRA DOS BOERS.